La Spirotechnique
Jacques Cousteau, enquanto estava vivendo em
Paris, viajava constantemente para o litoral para aperfeiçoar suas
habilidades de mergulho livre. Ele havia se casado com a filha do
presidente do conselho da empresa Aire Liquide, a
poderosa empresa industrial francesa fundada em 1902 que, durante a
guerra, produziu gás líquido para as forças nazistas. (1)

Na Aire Liquide, um jovem engenheiro francês Emile
Gagnan estava aperfeiçoando uma válvula de demanda para
ser utilizada na indústria automotiva.

Durante a guerra, a gasolina era um produto muito escasso. Gagnan
tinha desenvolvido um dispositivo que permitia aos automóveis
utilizar os gases da combustão parcial de madeira e outros
materiais. Sua válvula de demanda possuia uma função similar aos
carburadores de hoje. (1)
A pedido de Cousteau para fazer um regulador de respiração de
utilização subaquática, Gagnan modificou
esta válvula de demanda automotiva usando um desenho de uma patente
francesa de 90 anos. Era um dispositivo para respirar debaixo d’água,
chamado de AEROPHORE, de invenção de Benoit
Roquayrol e August Denayrouze. (1)

Jacques Cousteau é frequentemente chamado de o
inventor do Aqua-Lung, ou, como ele gostava de ser
chamado, o "pai do Aqua-Lung". Gagnan
foi o inventor de uma série de características que fizeram o
Aqua-Lung diferente dos demais dispositivos até então existentes
para a atividade de mergulho. (5)
Gagnan não foi o inventor do conhecido sistema
de demanda-diafragma-alavanca (O ar flui com a inspiração do
mergulhador). Tão pouco foi o inventor da válvula de redução de
alta pressão existente nos cilindros para uma pressão intermediária,
conhecido pelos mergulhadores como: primeiro estágio. Gagnan,
simplesmente, aperfeiçoou aqueles dispositivos já existentes para
atender as solicitações de Cousteau. (5)
Gagnan rearranjou os mecanismos existentes e os
aperfeiçoou para uso otimizado no mergulho. Este trabalho foi
reconhecido por vários escritórios de patente ao redor do mundo.

O Aqua-Lung, como o SCAPHANDRE AUTONOME ficou
conhecido nos EUA e no Canada, era composto pelo regulador, pelo
cilindro, pela válvula, pelo mecanismo de reserva e pelo harness.
Apenas duas características do regulador CG45
original (nome que ficou conhecido na patente original) não
existiam antes nos outros dispositivos já existentes na atividade
de mergulho: (5)
- mecanismo de reserva de ar;
- a posição da válvula de exaustão;
No livro "Le Monde du Silence", o
problema existente com a posição da válvula de exaustão e
descrito por Cousteu e Dumas. Um
dos primeiros protótipos de Gagnan, de 1943, era na verdade um
single hose (regulador de uma única mangueira) com o
"duckbill" (válvula de exaustão no formato de um bico de
pato) ou "flapper" colocado no mouthpiece (bocal). (5)
O ar não fluia bem quando o mergulhador estava na posição
vertical durante a descida. Em virtude de uma diferença de pressão
(maior na posição do "duckbill" do que no diafragma do
regulador) o ar não fluia bem e gerava uma dificuldade de respiração
para o mergulhador. (5)
Já na subida, com a cabeça mais alta que o corpo, o diafragma
(localizado no regulador no meio das costas do mergulhador) estava
sujeito a uma pressão maior que no "duckbill". Este
diferencial de pressão gerava um "free-flow" e o ar se
perdia pela válvula de exaustão. (5)
Quando o mergulhador estava na posição horizontal o regulador
funcionava perfeitamente. O diafragma e o "duckbill"
estavam na mesma profundidade. (5)
Estas observações levaram a uma possível solução para os
problemas relatados. A adição de uma segunda mangueira, levando a
válvula de exaustão para junto da área onde se localizava o
diafragma. Gagnan percebeu que esta era uma solução temporária
para os problemas encontrados.
A adição da segunda mangueira, levando de volta o ar exalado do
bocal para o nível do diafragma, solucionou o problema do free-flow
durante a subida do mergulhador. O mouthpiece/bocal deveria ficar
preso pelo mergulhador com o auxílio dos dentes e da musculatura da
boca. Mergulhando em uma posição de 20/30 graus em relação à
horizontal, os mergulhadores logo perceberam que a respiração
ficava bem mais fácil e agradável. (5)
Mas esta solução, com a adição da segunda mangueira, ainda não
solucionava o problema da difícil respiração durante a descida do
mergulhador. Na descida, a pressão ambiente era maior no bocal que
na válvula de inalação. Ou seja, o mergulhador tinha que fazer um
esforço grande para inspirar durante a descida.
Como a mudança da configuração, colocando as válvulas de
inspiração e expiração ("horns"/chifres de inspiração
e expiração) em um mesmo nível. Efetuam novos teste em um tanque
e durante o verão de 1943, Cousteau, Philipe Thailliez e Frédérik
Dumas testam os equipamento no MARNE RIVER no mar
Mediterrâneo.(4) (5)

O equipamento mostrou-se de fácil utilização, ser resistente e
confiável. Os três efetuaram centenas de mergulhos durante os
meses de julho e agosto, tentando testar os limites do equipamento.
A exata posição para a localização do "horn" de exaustão,
contendo o "duckbill" foi definada. (4) (5)
Em 1943, Custeau, Frederic Dumas e James Dugan escreveram e
publicaram o livro THE SILENT WORLD / Le Monde du Silence (O
MUNDO DO SILÊNCIO), que conta a historia do novo
equipamento e suas aventuras iniciais com o “Aqua Lung”. O livro
incentivou muitas pessoas a adquirir o novo equipamento e, é ainda
hoje, um dos documentos com maior influência na sensibilização de
pessoas para o mergulho. (4)
Em 1944, a patente do regulador foi requerida pela L'Aire
Liquide que custeou todo o desenvolvimento do projeto. A
empresa concordou que Cousteau e Gagnan
fossem nomeados co-inventores do novo dispositivo. A principal
prioridade da solicitação da patente foi proteger a posição da válvula
de exaustão. (5)
Gagnan supervisionou a construção de vários
protótipos do Scaphandre Autonome. Durante o período
de 1944 e 1945, ele se dedicou a projetar o mecanismo de redução
de pressão como uma unidade integral, ao invés de duas válvulas
separadas existente no protótipo CG43. (5)
No final de 1944, Gagnan desenvolveu um
mecanismo que ficaria acoplado em um bloco redondo de bronze
cromado. cujo desenho e forma se assemelhava a um relógio
despertado daqueles dias. Em 1945, a patente foi concedida e, uma
nova patente foi requerida descrevendo a forma geométrica final do
regulador (Pat. 2.485.039-1). O mecanismo interno
com seu estágio de demanda com diafragma ficou imutável nos próximos
13 anos. A denominação dada ao regulador foi Scaphandre
Autonome - CG45. (5)
Em 1946, A L'Aire Liquide começou a fabricar o
novo aparelho de respiração CG45. A divisão especial da Air
Liquide, chamada de Spirotechnique, foi formada para promover e
distribuir o regulador, com Jacques Cousteau como um membro do
conselho de administração da Spirotechnique. (1) (5)

O Scaphandre Autonome, já patenteado, começa
a ser fabricado e distribuído na França. Inicialmente, o
fabricante é a L'Aire Liquide, que demonstra, em
pouco tempo, não ter capacidade de resposta à demanda. O
equipamento é colocado à venda no Reino Unido em 1950, no Canadá
em 1951 e nos Estados Unidos em 1952, através da subsidiária da
L'Aire Liquide, a Spirotéchnique. (4)
As mudanças nos mecanismos internos do regulador CG45 foram
muito pequenas nos anos subsequentes. O mesmo não se pode dizer da
sua aparência externa, durante o período de 1946 a 1948. (5)
Basicamente, as mudanças no exterior do CG45 se destinavam a
achar a melhor posição e a melhor medida para os sistemas de inação
e exalação (horns/chifres e mangueiras). O CG45 original possuia
este sistema bem diferente da posição convencional que foi
utilizada por décadas nos reguladores double hose. (5)
Como podemos ver no desenho abaixo, verificamos que os
"horns"/chifres estavam localizados de maneira que o ângulo
entre eles era de 180o. (5)

Além disso, os protótipos de 1944-1945, que lembravam a forma
de um despertador, tinham algumas características herdadas da
configuração de montagem do regulador conhecido por CG43. A
montagem era feita de maneira que o lado da etiqueta
identificadora/label estava na posição contrária à cabeça do
mergulhador. Ou seja, o lado do Yoke estava voltado para o lado em
contato com a cabeça do mergulhador. (5)

Este tipo de configuração deixava a válvula de exaustão
(horn/chifre de exaustão) localizados do lado direito do
mergulhador e, consequentemente, o lado da válvula de inalação
(horn/chifre de inalação) sobre o ombro esquerdo do mergulhador.
Outra caracterísitca desta configuração era que a válvula
reserva e a sua vareta de acionamento eram utilizadados do lado
esquerdo do cilindro. (5)
Com a prática, os mergulhadores perceberam que a melhor
configuração seria com o do lado do regulador contendo o label
voltado para a cabeça do mergulhador e o lado do yoke voltado para
fora. Isto minimizava os riscos de acidentes com possíveis impactos
do regulador com a cabeça ( o lado que poderia gerar menos danos
seria o lado liso do regulador e não o lado do yoke). (5)
Com esta mudança, o ângulo de 30o., existente no
"horn"/chifre de exalação dos primeiros modelos do CG45,
deixou de existir. Com a rotação do regulador em 180o., decorrente
da nova configuração, o ângulo de 30o. deixava o "horn"
de exalação voltado para fora, o que prejudicava a harmonia do
posicionamento da mangueira. (5)
A nova maneira de se utilizar o regulador (giro de 180o.) com o
label voltado para a cabeça do mergulhador gerou uma série de
consequências nas configuraçãoes: (5)
- A mangueira de inalação passou para o lado
direito do mergulhador;
- Consequentemente, a mangueira de exalação
passou para o lado esquerdo do mergulhador;
- A válvula reserva e a sua vareta de
acionamento passam para o lado direito do cilindro em virtude da
rotação da válvula do cilindro em 180o.;

O uso do ângulo de 180o. entre os "horns"/chifres também
se mostrou incômodo aos mergulhadores. O ângulo de 90o. se mostrou
mais eficaz no processo de desalagamento das mangueiras. O atrazo
desta modificação vindo da fábrica (que utilizou as peças
existentes até o final de seu estoque com labels com um lado
paralelo ao encaixe do horn de exaustão) e as mudanças de ângulos
feitas no início diretamente pelos mergulhadores e depois pela fábrica,
gerou reguladores com labels inclinados no período de 1946 a
1948.(5)

Em 1947, os CG45 com a etiqueda de identificação conhecida
por BIG LABEL foram substituídos pelos
"labels" menores (3cm x 5cm - 1 3/16" x 1
15/16"). O reguladores já saiam de fábrica montados de
forma que a placa de identificação ficasse na posição
horizontal, com os "horns" a 90o. colocados na
direção nos vértices do label. Com a reestruturação da Spirotechinque
em 1947, os labels mudam, e passam a ter S.A.
(Societe Anonymé) ao invés de S.A.R.L.
(Responsabilite Limitee). (5)
Os reguladores CG45 para uso civil foram
produzidos em duas versões: (5)
- STANDARD STYLE - Que
utilizavam mangueiras de menor diâmetro (20mm - 3/4")
fixadas por braçadeiras nos "horns" e no
bocal/"mouthpiece" do tipo "T";
- DE LUXE STYLE (tipo dos
MILITARY/NAVY) - Que utilizavam mangueiras mais grossas
com diâmetros de 25mm - 1" e eram conectadas com roscas nos
"horns" e no bocal tipo "T";
Uma outra variação do CG45 foi desenvolvida
para utilizar ar vindo da superfície, ficaram conhecidos como
NARGHILÉ/HOOKAH. (5)


A La Spirotechnique, que foi
criada em 1946 como a divisão de equipamentos SCUBA da L'
Aire Liquide, e produziu os antigos modelos do
regulador CG45, e continuou até os anos 70 a produzir os
reguladores MISTRAL e o ROYAL
MISTRAL em vários formatos. (2)
O primeiro regulador de duas mangueiras fabricado pela La
Spirotechnique em 1946 possuia pelo menos quatro
diferentes versões em sua etiquetas (labels): (3)
- Big Label com "La Spirotechnique
S.A.R.L.";
- Small Label com "La Spirotechnique
S.A.R.L." ;
- Small Label com "La Spirotechnique
S.A." ;
- Sem Label de Identificação (existe uma
teoria que teria sido feito para a Marinha Francesa).

O regulador MISTRAL, feito pela La
Spirotechnique, na França, foi a linha de maior sucesso
dos reguladores de duas mangueiras na Europa. O seu desenho de estágio
único foi licenciado pela US Divers para o
mercador dos EUA e pela Siebe Gorman no Reino
Unido. Começando em 1955 e com produção até os anos 80,
o MISTRAL e o ROYAL MISTRAL
foram usados por mergulhadores no mundo inteiro. (2)
A primeira versão do MISTRAL foi feita como o
corpo cromado e yoke, e com uma etiqueta de identificação amarela
que estava rebitada ao corpo do regulador. (2)

Existem três diferentes endereços que foram usados nesta versão
e, que correspondiam à localização da fábrica:
- Rue Cognacq-Jay Paris VII (até 1956) (3);
- 27 Rue Trebois Levallois 92 (até 1962?);
- 114 Rue Marius Aufan Levallios (até
1992);

Assim com o CG45 Narghilé (Hookah),
também foi feita a versão MISTRAL Hookah com
alimentação de ar feita através da superfície.

A última versão do Narghilé possuia um
label redondo azul e prateado com a expressão NARGHILÉ.


Internamente, ele apresentava o desenho de estágio único padrão
de dois níveis. Em virtude da simplicidade de seu mecanismo e por
ser muito rústico e confiável, Cousteau escolheu este regulador
como o principal regulador e é o mais visto durante as viagens do
Calypso. (2)
Em 1962, a La Spirotechnique introduziu
o ROYAL MISTRAL, que internamente era igual as
versões antigas, mas tinha mudanças no corpo do regulador. Uma
etiqueta com uma coroa foi usada nos primeiros modelos (Primeira
Geração) e possuíam um desenho mais simples.

Existem algumas variações deste modelo com relação a existência
da porta/"port" de conexão HP para a mangueira do manômetro:
- Sem "port";
- Com "port" 3/8"
(acoplamento do tipo fêmea) de alta pressão para acoplamento da
mangueira do manômetro;
- Com"port" em medidas métricas
(com acoplamentos de 6mm do tipo fêmea e de 8mm do tipo macho).


O Royal Mistral da segunda geração mudou o label e tinha a
escrita e o logo em amarelo. O último ano de produção do Royal
Mistral foi 1987.


Com o passar dos anos, a La Spirotechnique
se expande cada vez mais no mercado do mergulho: (6)
- A TECHNISUB, nos anos 60,
passa a fazer parte do grupo;
- Nos Anos 70, adquire o grupo
FENZY;
- Nos anos 80, é a vez da SEAQUEST;
- Nos anos 90 absorve a APECS;
No final dos anos 90, a marca da empresa passa a ser:

Nos anos 2000, as marcas DRAGER, SUUNTO e
SEA&SEA assinam com a Aqua-Lung.
A Aqua-Lung decidiu, em 2004, em homenagem ao
estilo lendário do Mistral, lançar o "New
Mistral", este regulador de olhar
"vintage" possui o aspecto geral do antigo Mistral,
enquanto que o seu funcionamento se assemelha a um regulador
moderno. E em 2005, foi vendida uma edição histórica
comemorativa, limitada a 500 exemplares (1955-2005), que foi
comercializada em uma caixa de madeira e com certificado.

Atualmente, a AQUA-LUNG é uma das líderes de mercado juntamente com a SCUBAPRO e MARES.
Fontes:
(1) http://www.internationallegendsofdiving.com/Articles/miller_072705.htm
(2) http://www.vintagedoublehose.com/index.php/component/content/article/95.html
(3) http://frogmanmuseum.free.fr/html/regulatorslaspirotechniqueen.htm
(4) Revista Digital Planeta D’água de maio de 2005
(5) Emile Gagnan and the "Aqua-Lung" Part 1: 1948-1958 by Phil Nuyten
(6) http://divetec.bg/filez/file/MANUFACTURING2005.pdf
(7) Catálogos da La Spirotechnique
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